Lei De Drogas Recorrer Em Liberdade

Syracuse University - A GRAMÁTICA DE Padre GASPAR. 2ª PARTE - TEMPO DA QUARESMA PENITÊNCIA 49 - Ao Encontro do Jejum com Alegria Com alegria, vamos preparar nosso espírito para viver o jejum e a abstinência quaresmais. É um convite que pode soar algo estranho. Contudo, ele é importante, porque tudo quanto nos vem proposto por lei deve ser cumprido com jovial disponibilidade, como se fosse escolha pessoal. E tem que ser assim, pois não podemos nos deixar impressionar pelas aparências, mas refletir sempre sobre os motivos do que fazemos, com espírito tranqüilo. Veremos, então, que o jejum e a abstinência quaresmais, juntamente com outras práticas de penitência que os acompanham, estão entre os meios seguros e válidos para preservar ou recuperar o bem-estar espiritual. O caso de Nínive é uma prova bastante convincente do valor e da eficácia de tais meios. A situação da cidade estava de tal modo comprometida que um profeta, expressamente mandado por Deus, havia predito que, dentro de quarenta dias, seria sepultada sob as próprias ruínas. Logo que os habitantes se convenceram de que o jejum era o remédio para seus males tudo mudou. Deus se aplacou e eles conseguiram o perdão. Conta-se no Evangelho que os discípulos, uma vez, vieram ao encontro de Jesus tristes, depois de tentarem inutilmente expulsar demônios de um possesso. Jesus deu-lhes a seguinte razão: "esta espécie não pode ser expulsa a não ser pela oração e o jejum" (Mt 17,21). Sumamente necessária, a oração haure sua força do jejum para poder agir: "é boa a oração com jejum" (Tb 12,8). De fato, o jejum torna a mente ágil, ativa e desimpedida, emprestando-lhe asas para chegar até Deus. Deixemos de lado a queixa de que nossas orações estão se tornando vazias, de que as tentações estão aumentando a cada dia, de que não sabemos mais a que meios recorrer para diminuir nossas fraquezas. É melhor convencer-se de que, quando os exorcismos mais poderosos tornam-se inúteis, é exatamente aí que o jejum torna-se meio eficaz e apropriado para se alcançar pleno êxito. Jejua, portanto, para não pecar; jejua porque pecou; jejua para receber os dons do Senhor; jejua a fim de que o que recebeste permaneça. 50 - Remédio para a Alma e Também para o Corpo A eficiência do jejum não se limita à esfera do espírito, cabendo ao corpo experimentar apenas um pouco de amargor e repugnância que habitualmente os remédios mais eficazes provocam. O jejum é também remédio útil, e até necessário, para manter o corpo sadio e prolongar a vida. "Pela gula insaciável muitos pereceram", diz o Eclesiástico. "Quem, porém, é sóbrio, prolonga a vida" (Eclo 37,31). E é verdade. O prazer, as delícias com banquetes e bebidas, o hábito de jamais dizer não aos desejos da gula, tudo isso debilita e corrompe o corpo, levando-o à morte prematura. A mortificação, a sobriedade e a abstinência, ao contrário, são meios que rejuvenescem, conservam e robustecem o corpo. Torna-se evidente, portanto, que o jejum quaresmal é remédio não só útil, mas necessário, para a salvação da alma e do corpo. Então, por que não abraçá-lo com satisfação e cheios de alegria? Somos cristãos. Cristo com o seu exemplo nos animou a tomar, de boa vontade, esse remédio. Ele observou por quarenta dias um jejum rigoroso. Observemos também os santos. Quantos trabalhos agüentaram e sofreram pela salvação da própria alma! Por isso, não imitemos as crianças que recusam remédios salutares porque deixam gosto amargo na boca. À luz de tais critérios, portanto, vamos dispor nosso espírito a penetrar com muita alegria na santa Quaresma. Purificados por meio do jejum e da abstinência, e ornados com sólidas virtudes, tornemo-nos dignos de celebrar frutuosamente a Páscoa do Senhor aqui na terra, para sermos depois admitidos à Páscoa eterna no céu. 51 - Condições Indispensáveis para Seguir a Cristo "Se alguém quer vir após mim, renuncie a si mesmo, tome a sua cruz, e siga-me" (Mt 16,24). "Renuncie a si mesmo". Este é o espírito da penitência. Efeito deste espírito é a mudança do cristão por inteiro: exteriormente, renunciando a seus pertences; interiormente, renunciando a si mesmo. Renuncia a seus pertences quem deles se afasta: esta é a atitude menos difícil. Renuncia a si mesmo quem deixa de viver segundo a antiga vida carnal de Adão para viver segundo a nova vida espiritual da graça: este é o aspecto mais exigente. Tudo isso se realiza quando a pessoa, por espírito de penitência, é levada a deixar de lado o que antes amava e a amar o que antes punha à parte. O bom penitente e aquele que renuncia autenticamente a si mesmo são, por exemplo, os que antes eram intemperantes e depois se tornaram muito mortificados; antes se entregavam a impurezas, depois se tornaram castos; antes eram avarentos, depois se tornaram profundamente generosos. "Tome a sua cruz". O verdadeiro seguidor de Cristo a toma nos ombros não por imposição, como o Cireneu, mas por escolha plenamente livre e com total espontaneidade. Não a arrasta só por obrigação ou imposição, mas resignadamente, talvez com lamentações e queixas, porém, louvando a Deus e com alegria interior, alimentando em si mesmo o amor de poder sofrer por Cristo. "E siga-me" é o espírito de amor no seguimento de Cristo. Cada um pode, de acordo com a própria capacidade, atingir esse objetivo; ou ao menos planejá-lo e visualizá-lo para lá chegar progressivamente, conforme o desígnio divino. Estes critérios constituem o início, o crescimento e a meta da Santidade. 52 - As Três Cruzes Ninguém passa por esta vida sem cruzes. A escolha se faz diante de três cruzes: a primeira é a de Cristo; a segunda, a do bom ladrão; e a terceira, a do mau ladrão. A primeira leva à glória e pertence aos inocentes, que, assim, se assemelham bastante a Cristo. A segunda proporciona consolação e pertence aos penitentes, que, por meio da paciência, não perdem nem a resignação, nem a paz. Quem não toma sobre si uma dessas duas carregará certamente a terceira, a do mau ladrão. Sofrerá muito mais e sem merecimentos. Ou pior: essa cruz lhe servirá de escorregador para descer às profundezas do inferno. Aqui na terra, toda penitência é breve, passageira e eficaz. No inferno, porém, é longuíssima, duradoura e inútil. Quem não quiser penitenciar-se nesta vida arrepender-se-á inutilmente na outra. A alma justa, uma vez obtida a glória, agradecerá imensamente a penitência praticada na terra. Em troca de pouco sofrimento alcançará felicidade sem fim na outra vida! Contrariamente, a alma condenada amaldiçoará seus prazeres, os falsos amigos e os pecados cometidos. "Insensatos..., ficamos enredados nos caminhos da iniqüidade e da perdição... e ignoramos o caminho do Senhor" (Sb 5,4-7). Teremos um dentre dois destinos. Insensato é quem conhece tais possibilidades pela fé, mas não se preocupa em escolher bem, enquanto está com vida. Na eternidade o arrependimento só vai aumentar-lhe o desespero. 53 - A Mortificação Realizar tudo para a maior glória de Deus e por seu amor. Como conseqüência vêm o desprezo pelo mundo e o abandono de todos os vícios. É preciso desacostumar-se a fazer a própria vontade e habituar-se a realizar tudo movido pela vontade de Deus, a fim de agradá-lo e honrá-lo. Nossa mortificação tem que ser universal, exterminando todo tipo de paixão. Agir por instinto da natureza, mesmo que por um só instante, é impedir a ação de Deus, para dar lugar aos impulsos da criatura. "Não posso", na boca de pessoas espirituais em matéria de mortificação, soa muito mal, porque em Deus tudo se pode. O que se quer é encobrir a falta de mortificação, com o pretexto de que vem do céu ou, então, fingir que se está contente com esta vontade do céu, permanecendo prazerosamente nos próprios defeitos. Por outro lado, é preciso discernimento para não se sobrecarregar com muitas penitências e ocupações. Quanto à penitência, uma norma universal para todos os confrades é esta: na alimentação, no vestuário e nas outras coisas necessárias à vida, todos se contentem com o que for distribuído ou concedido pelos Superiores. Cada um, então, aceitará e agradecerá a penitência que o confessor ou o superior lhe impuser no Senhor. E as desejará e pedirá outras maiores, conforme a medida de suas forças e da graça. Cabe, pois, ao confessor ou ao superior determiná-las ou moderá-las. Aos que fogem da mortificação interna e desejam somente a externa é bom que esta lhes seja proibida. Pelo menos assim poderão ser levados à interna pelo próprio desejo de compensar a ausência da externa. 54 - Um Grande Penitente: São Francisco Vamos rever agora a profunda mudança que aconteceu na vida de São Francisco. Era homem bastante rico. Tinha os olhos, as mãos e os esforços voltados apenas para o acúmulo de riquezas nas praças mais acreditadas do comércio. De um momento para outro, desfaz-se de tudo e coloca-se à porta de uma Igreja, em meio a uma multidão de pobres, com roupa de pobre, que recebera de um deles, em troca da sua. Passa a direcionar todo seu esforço, ardor e zelo para a pobreza. Qual a razão para tamanha e surpreendente mudança de comportamento? Provém de uma insólita mudança de sentimentos: "essas coisas, que eram ganho para mim, considerei-as prejuízo por causa de Cristo" (Fl 3,7). Mais ainda, iluminado pela luz divina, o santo progride tanto que chega a julgar como perda não somente o que antes considerava lucro (riquezas, prazeres, reputação mundana), mas tudo o que não era Cristo, como, por exemplo, a elevada condição social, a esperteza nos negócios, a abundância de aptidões comerciais e a multiplicação de bens. Sempre pela mesma razão: Cristo. Impressionante a mortificação austera de São Francisco, imposta por ele a si mesmo: comida escassa, apenas para garantir o sustento; sono brevíssimo, com o corpo deitado no chão, após um dia inteiro de pregação; corpo envolto em roupa pobre e grosseira, sofrendo tanto no frio como no calor; uso de cilícios atrozes, flagelações e prolongados jejuns. Em síntese, São Francisco assumiu viver a vida terrena como contínuo martírio, pregado em uma cruz, junto com Cristo. "Por ele, o mundo está crucificado para mim como eu estou crucificado para o mundo" (Gl 6,14). De fato, o amor jamais diz: basta. PENITÊNCIA E CARIDADE 55 - Teu Jejum Torne-se Alimento para o Pobre A característica específica da verdadeira caridade é esta: "não é interesseira" (1Cor 13,5). Quem, de fato, ama com autêntica amizade deve procurar o que é útil para o amigo; ao passo que quem só procura desfrutar do amigo para realizar interesses pessoais não ama o amigo, mas a si mesmo. Quem de nós está disposto, não digo a dar a vida por amor ao próximo, como fazem os santos já perfeitos, mas, a se desfazer, de boa vontade, do supérfluo de suas riquezas, que muitas vezes são inutilmente dissipadas e alimentar o irmão que definha de fome? Estaria apenas concretizando o preceito! Há, quem, em vista do zelo pela salvação do próximo, preocupa-se em "assistir o irmão segundo as próprias posses" (Eclo 29,27), em usar com discrição a correção fraterna ou em dar bom exemplo e rezar por ele? Estaria apenas observando - sem mudar nada - o preceito categórico com o qual "Deus ordenou que cada um se preocupasse com o próximo" (Eclo 17,12). É preciso que nos empenhemos em observar tal preceito para começar a viver a caridade que se caracteriza principalmente em procurar não os próprios interesses, mas tudo o que é útil ao próximo. 56 - A Caridade Custa Sacrifício A caridade exige que eu saiba alegrar-me com os que estão alegres e chorar com os que choram (Rm 12,15). Entretanto, não é verdade que, neste ponto, eu a transgredi muito e talvez continuo transgredindo? Exijo que ela seja exercida a meu favor; mas, até que ponto eu a coloco em prática em prol das pessoas às quais, tantas vezes, devo favores? Ao invés de fazer aos outros o bem que posso, talvez tenha inveja do que lhes é feito e, em certas ocasiões, procuro até me opor e colocar obstáculos. Ao invés de preveni-los, ajudando-os em ocasiões que não eram estritamente exigidas pelo dever, pode ter acontecido que, estando envolvido no exercício do meu dever, tenha me esquecido de lhes facilitar o cumprimento do que é obrigatório. Ao invés de interessar-me por aqueles que estão passando por momentos críticos, não aconteceu, às vezes, que eu tenha chegado a sentir uma perversa alegria e de ser eu mesmo o causador dos males? Jesus Cristo já nos advertiu que seremos tratados pelo Pai do mesmo modo como tratamos nossos irmãos. Caso contrário e de acordo com tal exigência, que posso esperar de Deus e com qual confiança poderei pedir-lhe que derrame sobre mim a abundância de suas graças? 57 - Exigências da Caridade Fraterna A caridade, diz São Paulo, em primeiro lugar, é "paciente", para poder suportar os defeitos do próximo. Depois, é "prestativa", a fim de conquistar para Cristo, com doçura, as almas dos irmãos, desejando-lhes ardentemente a salvação eterna e todo tipo de bens. "Não é invejosa" diante da prosperidade. Para não estorvá-los no caminho da perfeição, "nada faz de inconveniente". "Não se incha de orgulho" por causa de alguma qualidade material ou espiritual e evita absolutamente desprezar os irmãos. "Não se ostenta", pretendendo ser superior ou dominá-los. Pelo contrário, para estar sempre a serviço e solícita em valorizá-los, "não procura seu próprio interesse". Provocada pelas injurias, "não se irrita" e jamais se vinga. "Não guarda rancor", pois procura interpretar tudo do melhor modo, desejosa apenas de ajudá-los a emendar-se. "Não se alegra com a injustiça", lastimando os pecados do próximo como se fossem seus próprios. "Regozija-se com a verdade", beneficiando-se das virtudes alheias. Finalmente, a caridade "tudo desculpa, tudo crê, tudo espera, tudo suporta" por amor ao próximo quando se trata de lhe proporcionar o verdadeiro bem. Sabe que, com isso, agrada a Deus, por cujo amor é suavemente levada a amar o próximo (1Cor 13,4-7). PENITÊNCIA E ORAÇÃO 58 - Meu Deus, Meu Tudo! "Para ti levanto os olhos, para ti que habitas nos céus. Como os olhos da escrava olham para a mão da sua patroa, assim nossos olhos estão voltados para o Senhor nosso Deus, até que tenha piedade de nós" (Sl 123,1-2). Não afastemos os olhos do Senhor, continuando ininterruptamente a oração, enquanto ele não der a graça e não usar a misericórdia, enviando as luzes de que necessitamos. "Piedade de nós, Senhor, piedade, pois estamos saturados de insultos" (Sl 123,3). Observemos como nossos defeitos, nossas imperfeições e faltas nos tornam dignos de zombaria e de desprezo a nossos próprios olhos, pelo pouco que nos conhecemos. Contudo, aos olhos e ao coração de Deus, que tudo vê, aparecem como a razão mais eficaz para nos conceder suas graças e usar de misericórdia, "pois estamos saturados de insultos". É a oração típica da alma verdadeiramente generosa que vence e força o coração de Deus. E este, de fato, é o modo melhor de levar Deus a nos estimar mais, pois estamos reconhecendo a amplitude de nossas limitações. Em síntese, é a oração digna de quem tem um coração conforme o coração de Deus, como era o de Davi. Ó Deus imenso! Como sois bom, amoroso e condescendente para conosco, apesar de sermos vermes miseráveis! Quando será que vos amaremos de todo o coração e vos conheceremos como sois na realidade? "Meu Deus e meu tudo!" 59 - A Única Coisa Necessária Nosso Senhor nos assegura que "uma só coisa é necessária. Maria escolheu a melhor parte, isto é, cuidar só daquilo que é mais importante, e esta não lhe será tirada (Lc 10,42). Tudo o mais é ocupação secundária. Parece que o Senhor age como certos esposos deste mundo. Eles reservam para si as preocupações com grandes negócios. Deixam a administração dos afazeres domésticos à sua prudente esposa, pouco se interessando com eles. Diante da primeira observação delas, estão prontos a dizer: cuidem vocês mesmas, cuidem vocês e tudo estará bem feito. De fato, observem a proverbial preocupação de Nosso Senhor. "Faznos viver em função das coisas do alto, espiritualizando tudo, de tal modo que não demos muita importância ao que diz respeito a nossos sentidos. Coloca-nos acima de tudo. Procuremos, pois, penetrar no coração de Deus, confiando em sua infinita misericórdia e bondade, jamais nos afastando dele, aconteça o que acontecer". Isto é o que conta. É disto que o Senhor se ocupa solícita e plenamente. Apesar de nossa pouca prudência, como se não quisesse saber dos bens, permite-nos administrá-los, oferecendo-os e consagrando-os livremente a Ele. "Jesus Cristo é o mesmo, ontem, hoje e sempre" (Hb 13,8). Ontem, advertia-nos e preparava-nos para carregar tudo com coragem. Hoje nos concede mais coragem e paciência ainda, tão necessárias para suportar qualquer tipo de tribulação, em vista de sua maior glória. "Bendirei o Senhor em todo o tempo, seu louvor estará sempre na minha boca" (Sl 34,2). 60 - Distrações, Tentações, Aridez Se na oração e na meditação somos tentados por distrações, não devemos perder a coragem e deixar de rezar, mas perseverar sempre. Permaneçamos na presença de Deus, apesar das distrações, e não reduzamos por isso o tempo destinado à oração. Durante a oração, é preciso saber reconhecer e apresentar humildemente a Deus a nossa condição de precariedade, que não nos permite elevar perfeitamente o coração a Ele como gostaríamos. Repitamos com o salmista: "meu coração desfalece. Digna-te, Senhor, livrar-me; vem depressa, Senhor, em meu auxílio!" (Sl 40,13-14). Também o demônio faz de tudo para perturbar as pessoas que rezam. Porém, nós, mesmo frustrados pela tentação, persistiremos no propósito e esforço de rezar, certos de que estes serão creditados como frutos da oração. Embora não se consiga libertar-se completamente dos pensamentos perturbadores insinuados pelo tentador, sem dúvida, receberemos de Deus o prêmio pelo esforço. Se não há consentimento na tentação, conseguir-se-á, na verdade, uma vantagem maior por causa de tal sofrimento. Pode acontecer que na oração e na meditação não se consiga encontrar nenhum sabor e prazer e se venha a cair na aridez interior. Mantendo-nos, porém, fiéis às práticas de piedade e procurando cumpri-las do melhor modo possível, podemos contar com a bondade do Senhor, que sempre as acolhe com benevolência. Não há dúvida de que o Senhor fica satisfeito toda vez que seus eleitos procuram estar em sintonia com Ele, por meio do empenho. O PECADO 61 - Graça e Pecado Quem somos nós cristãos? Não olhemos ao redor e fora de nós. Entremos em nosso interior, na parte mais íntima de nós mesmos. Por natureza, somos imagem fiel da face de Deus. Além disso, somos por Deus constituídos os senhores da terra, a fim de que todas as criaturas nos sirvam. O próprio céu está destinado a nos servir com o esplendor de sua luz. Pela graça, fomos elevados à mesma ordem da natureza divina, da qual somos participantes. Somos filhos de Deus. Cristo é nosso irmão. Somos declarados herdeiros de Deus. Nossas almas são esposas do Espírito Santo. Não nos deu Ele um penhor riquíssimo de preciosos dons? Não foram os anjos, príncipes do céu, destinados a cuidar de nós aqui na terra? Por acaso, o próprio Filho de Deus não desceu do céu, revestindo-se de nossa natureza para viver conosco? Como podemos ficar indiferentes e com a consciência tranqüila sabendo que estes senhores da terra, herdeiros do céu, filhos de Deus e almas esposas do Espírito Santo, submetem-se à torpe escravidão do pecado e do demônio? Não nos envergonha essa escravidão tão indigna? Onde fica a nobre e divina origem de nosso ser, o amor transcendente de nossa liberdade? Até quando permaneceremos presos a essas cadeias, suportando a dominação de tiranos monstruosos? Pensemos seriamente como recuperar nossa liberdade, dignidade e esplendor. 62 - A Ofensa a Deus O pecado, como injúria à majestade infinita de Deus, possui tal amplitude de malícia e profunda deformidade que não pode ser adequadamente reparado por nenhuma ação de qualquer criatura. Assim, não podendo cria-tura alguma quitar essa dívida incalculável, o Senhor veio pagá-la por nós. Fez-se homem e assumiu, em sua imensa bondade, o resgate da dívida por um ato de mérito infinito. A rigor, sabemos que bastaria para tanto um simples suspiro de Cristo, Homem-Deus, enviado ao céu. Ele fez muito mais. Para nos fazer ver melhor a aversão ao pecado e levar-nos a perceber a gravidade do mal, pago com preço alto, carregou-se de tantos sofrimentos internos e externos que não há mente humana capaz de compreender isso plenamente. Contemplemos, pois, o Crucificado, Jesus, que possuía um corpo perfeito e sensível, sofrendo dolorosamente em todos os seus membros e sentidos, sendo desprezado por todo tipo de pessoas. Poder-se-ia pensar que Cristo não suportaria tanto sofrimento. Contudo, ele o abraçou com a finalidade de padecer muito, Ele que havia feito tantos milagres para abrandar os sofrimentos dos outros! O pecado não é, pois, um mal qualquer ou uma espécie de passatempo. Quando pecamos, voltamos a crucificar Cristo, porque para compensar uma ofensa de forma o mais justa possível requer-se uma satisfação não menor do que a oferecida sobre o Calvário. O pecado, portanto, é uma tentativa de anular a força da Paixão de Jesus e torná-la ineficaz em vista da salvação. Quem quiser saber o que é realmente o pecado, coloque-se diante do Crucificado e aí aprenda. 63 - A Morte da Alma Como a alma é a vida do corpo, assim Deus, mediante a graça, é a vida da alma: "Ele é tua vida" (Dt 30,20). Como o corpo morre se a alma o abandona, assim morre a alma se pelo pecado mortal Deus é dela afastado. Vamos refletir mais a fundo sobre a realidade desta morte. A vida se manifesta especialmente na forma de movimento e atividade. Ora, o que pode fazer de meritório, na ordem sobrenatural, a alma em pecado? E como poderá se mover na caminhada que conduz à felicidade eterna? O pecado elimina até mesmo a capacidade de agir na ordem da graça e, portanto, também o direito a todo merecimento, pois, neste caso, tudo é feito sem Deus. Como a alma, diz Santo Agostinho, enquanto está no corpo confere-lhe vigor, beleza, movimento e funcionamento dos diversos membros, assim também enquanto Deus está na alma confere-lhe sabedoria, piedade, justiça, caridade. A caridade é a raiz do merecimento. "Se eu gastasse todos os meus bens no sustento dos pobres e até me entregasse como escravo, mas não tivesse amor de nada me aproveitaria" (1Cor 13,3). Reflitamos, além disso, sobre o fato de que o pecado conduz, gradativamente, a uma segunda morte, ainda mais funesta, a de perder a vida eterna para a qual o homem foi criado, sepultando-o na Geena, no fogo inextinguível (Mc 9,43), "onde haverá choro e ranger de dentes" (Mt 8,12). Condição frustrante é a de quem permanece no pecado! A alma está morta. Quem a poderá libertar? A penitência, só a penitência. 64 - Conseqüências do Pecado Quem introduziu todos os males que imperam no mundo? O pecado de Adão. "Deus fez reto o ser humano" (Ecl 7,29), senhor de si e das demais criaturas. Porém, o homem, rebelando-se de maneira tola contra Deus, perdeu a posse pacífica sobre elas. Se, portanto, o pecado foi desde o princípio o traidor que saqueou o mundo, colocando-se à frente do inumerável exército de desgraças que o afligem, é lógico pensar que, em seguida, também foi ele quem veio introduzir todos os males em nossas casas. O pecado atual gera em cada pessoa, proporcionalmente, os mesmos efeitos que o pecado original produziu no gênero humano. Aí está a verdadeira fonte de todos nossos males. Por isso, custa-nos muito retornar às fontes deste turvo Nilo, que nos inunda com uma enchente de angústias. Com isso não se quer afirmar que haja correlação entre cada pecado e nosso sofrimento. O principal dano que o pecado provoca, diretamente, é a perda dos bens espirituais, pois tolhe, de imediato, a graça santificante que é a vida da alma. E, com a graça, retira também as virtudes infusas, o merecimento pelas obras realizadas e o direito à vida eterna. Acaba com a tranqüilidade e a paz, deixando um doloroso remorso, que envenena toda a alegria do pecador. A verdade é que a "justiça exalta uma nação, enquanto o pecado é a vergonha dos povos" (Pr 14,34). Em meio a uma multidão, não é, na realidade, quem está ao nosso lado que nos empurra, mas os que estão distantes, porque pretendem conseguir um lugar para si. Assim, os pecados. Como dão origem a grandes males e destroem povos e impérios inteiros, têm muito mais força para derrubar uma casa. Quando introduzimos numa casa a piedade, aí semeamos o bem. Quando tiramos o pecado, tiramos todo mal. 65 - Luta contra o Pecado "Filho, tu pecaste? Não tornes a fazê-lo; e suplica pelas faltas passadas" (Eclo 21,1). Se tu caíste no pecado, ferida mortal para tua alma, o primeiro remédio necessário para curá-la é não cometê-lo mais. Infelizmente, há muitos que, quando cometem o pecado, se desesperam pela perda da inocência e da graça e se deixam levar por todo tipo de transgressões, revolvendo-se na lama dos prazeres desregrados. "Não tornes a fazê-lo", porque a recaída no pecado é novo ferimento na alma e quem recebeu um ferimento tem que se cuidar bem para não sofrer outro. É mais fácil curar um só ferimento do que dois, três ou mais. Recaindo-se no pecado, há uma espécie de arrogância e acomodamento do espírito que ofende gravemente a Deus, dificultando quer a cura de quem caiu, quer o perdão da culpa. "Súplica pelas faltas passadas". É o que vale para reparar o pecado. Não basta, de fato, evitar a repetição do pecado e corrigir a conduta de vida como se a penitência não fosse outra coisa senão um simples arrependimento. Este é importante, mas o fundamental é pedir perdão com humildade e contrição. Os pecados permanecem se não forem perdoados. 66 - O Pecado Venial Deliberado Em relação à alma, o pecado venial é um tipo de mancha que não tira a beleza intrínseca da graça santificante. Priva-a, porém, de seu esplendor. E se pensarmos como é bela a alma em estado de graça, como considerar ser coisa pouca qualquer diminuição de tal esplendor? O pecado venial, portanto, opõe-se à vontade de Deus, porque, mesmo não estando em contraste com o fim da lei, que é a caridade, não observa essa lei com a devida perfeição. Portanto, atenuará o ardor da caridade. Um mal que se opõe ao cumprimento perfeito dos desígnios de Deus não pode, certamente, ser chamado de mal secundário. Nosso Senhor não o considerou assim. Ele ofereceu à divina justiça sofrimentos, sangue e até a própria vida não só para apagar os pecados mortais de todos os seres humanos, mas também os veniais. Além disso, o pecado venial é relevante por causa de seus efeitos. E o efeito mais pernicioso é o de dispor a pessoa para o pecado mortal. Indiretamente, mina as defesas e destrói os diques que seguram a enchente perniciosa. Debilita a prática das virtudes e acostuma a vontade a ferir a lei divina com falhas consideradas de pouca importância. É tropeço que leva a infrações mais graves. Diretamente, direciona afetos e atitudes para coisas vãs, que conduzem a pessoa a realizar o que é efetivamente mau. Isto se nota, sobretudo, nos casos em que o pecado venial tem algo em comum com o mortal: a matéria, diferenciada apenas pela quantidade. Como acontece, por exemplo, no furto e nas calúnias. Em síntese, o pecado venial, na prática, distingue-se do mortal só como o pequeno do grande. É uma centelha. Se o demônio começar a soprar, o fogo será inevitável. A TIBIEZA 67 - A Doença e os Remédios "Não acho perfeitas aos olhos de meu Deus as tuas obras" (Ap 3,2), obras vazias de espírito, caridade e zelo. És como árvore florida, mas estéril (Mc 11,13, seguintes), que tem aparência de fé convicta, mas não produz frutos e obras. Não és constante nem perseverante quanto à realização do bem. Quando fazes alguma boa obra, não a executas com reta intenção, mas por interesse ou vanglória, com preguiça e fadiga, manchando-a com atitudes nada recomendáveis. Há um pouco de Deus, um pouco do diabo; um pouco de Cristo, um pouco do mundo; um pouco de materialismo, um pouco de espiritualidade; um pouco de vaidade, um pouco de devoção; um pouco de maldade, um pouco de caridade um pouco de oração, um pouco de imprecações contra Deus. O espírito de Cristo obscurece misturando-se com o espírito do mundo; a fé, com as máximas da secularização; a caridade cristã, com a máscara da honestidade pagã. Obras que poderão parecer boas a seus próprios olhos, aos do mundo e aos dos homens, mas não, certamente, aos olhos de Deus. Para superar essa ambigüidade, procura aplicar-te à escuta da Palavra de Deus e a não dar muita importância às máximas do mundo. Mantém-te fiel à tradição cristã e aos ensinamentos do Magistério da Igreja sem deixar-te levar por falsas novidades. Procura, pois, vencer respeitos e temores mundanos, raciocínios alienantes das filosofias que se levantam contra a Igreja. Pratica fielmente a humilde doutrina de Cristo, pregada pelo sucessor de Pedro. Tem os olhos sempre abertos diante das realidades. Faze penitência, porque muitos são os pecados e muitos os perigos que levam a pecar. "Quem tem ouvidos ouça o que o Espírito diz às igrejas" (Ap 3,6). Não é a carne, nem o mundo ou certas filosofias, mas é o Espírito quem repousa sobre "o pobre, o de espírito abatido" (Is 66,2), ajudando a evitar todo tipo de fingimento ou hipocrisia (Sb 1,5). 68 - Oxalá Tu Fosses Frio ou Quente! "Ao Anjo da igreja que está na Laodicéia escreve: conheço a tua conduta" (Ap 3,14-15). Tu não a conheces, nem quiseste conhecê-la. Porém, eu irei mostrá-la como é, e não como teu amor próprio pensa que é. Não és nem frio nem quente. Quem vive oscilando entre virtude e vício, provavelmente, gostaria de viver santamente. Todavia, não se decide, com generosidade, a sair definitivamente desse estado e teme a necessidade do empenho em adquirir as virtudes. "Oxalá fosses frio ou quente! Mas porque és morno, nem frio, nem quente, estou para vomitar-te da minha boca" (Ap 3,15-16). A tibieza é bem pior do que a frieza do pecador que está disposto a reconhecer seu pecado. Freqüentemente houve casos de pessoas indiferentes e pecadoras que se converteram e chegaram a níveis de verdadeiro fervor. O que não aconteceu com aquelas que viveram na tibieza. De fato, encontrando-se nelas a negligência da alma tíbia unida à falsa tranqüilidade em que vivem, facilmente passam da sonolência espiritual ao estado de letargia mortal. Além disso, em certo sentido, a tibieza revela-se ainda mais perigosa do que a própria frieza do pecado, porque tem sua raiz no pior de todos os vícios: a soberba, aliada à presunção. Dizes: "sou rico e abastado e não careço de nada" (Ap 3,17). É próprio dos tíbios confrontar-se não com o Evangelho, nem com a doutrina e o exemplo dos santos, mas com o modo de pensar dos mundanos. "Senhor, Senhor, não foi em teu nome que profetizamos? Não foi em teu nome que expulsamos demônios? E não foi em teu nome que fizemos tantos milagres? (Mt 7,22). Entretanto, o Senhor responderá: "jamais vos conheci. Afastai-vos de mim, vós que praticais a iniqüidade" (Mt 7,23). "Dou-te um conselho: compra de mim ouro purificado no fogo, para ficares rico, e vestes brancas para vestires e não aparecer a tua nudez vergonhosa; e compra também um colírio para curar os teus olhos, para que enxergues" (Ap 3,18). O ouro purificado pelo fogo é a caridade expurgada de todo tipo de hipocrisia e contaminação das paixões humanas. As vestes brancas significam a inocência e a pureza de vida. O colírio é a humildade, que faz a pessoa ver claramente seus males, manifestando-lhe a necessidade do auxílio divino e, portanto, a exigência de procurar merecer este auxílio por meio de vida santa e fervorosa. A TENTAÇÃO 69 - Como Acontece a Tentação Deus permite que sejamos tentados pelo espírito mau, pelo espírito carnal e mundano, pelo amor próprio, tendo sempre em vista o bem. Convém não esquecer que, geralmente, o espírito maligno procura aliar-se com o espírito humano e carnal, com o nosso amor desordenado pelos prazeres, com a atração mundana pelos bens e pelas honrarias, com o orgulho. Se o demônio encontra um ponto de apoio consistente em nossa alma a ser tentada, então, começa a promover uma guerra interior muito intensa. No entanto, se não encontra o ponto de apoio - porque nossa alma está procurando constantemente purificar-se, colaborando com a obra da graça de Deus, - o maligno sai à procura de outros cúmplices: de preferência as pessoas que estão mais próximas de nós, mesmo aquelas as quais estamos mais intimamente unidos por laços particulares de amizade, con-fiança e obediência. Pode, por exemplo, suceder que, para desviar um jovem de seu propósito de consagrar-se inteiramente a Deus, o maligno se sirva de algum sacerdote, pouco fervoroso ou mundano, do qual o jovem se aproxima com simplicidade no intuito de receber conselho e orientação. Ó Senhor, por meio dessas provas, tendes sempre uma finalidade boa, ao passo que o demônio visa o oposto. Tendes a intenção de purificarnos de nossos defeitos e fazer-nos corresponder melhor à nossa vocação. O demônio, ao contrário, quer nos levar a cair na infidelidade e colocarnos em atrito com vosso chamado. Fazei, Senhor, que possamos conhecer tão bem os desígnios de vossa amorosa Providência e desvendar as tramas do maligno de modo a obter, através dessas provas, que nosso espírito se fortaleça na fidelidade a Vós e empenhe-se em corresponder melhor à vocação que nos foi proposta. 70 - Deus Sabe Haurir Vantagens da Tentação Se a Providência Divina que em tudo concorre para nosso bem consente que o demônio nos tente, limita, entretanto, a intensidade da tentação, não permitindo que sejamos tentados acima de nossas forças (1Cor 10,13). Concede auxílios espirituais e aumenta as defesas externas, a fim de que, cooperando com a graça, possamos vencer. Além disso, há a maternal vigilância da Igreja, Esposa de Cristo. O Senhor lhe concede zelo para proteger seus filhos e luzes para guiá-los na luta. Por isso, Deus, com sua amorosa Providência, e a Igreja, com seu cuidado maternal, com nossa cooperação, sabem conduzir a experiência das tentações a um êxito feliz: "junto com a provação ele providenciará o bom êxito" (1Cor 10,13). Uma primeira vantagem é a firmeza nas virtudes, a conquista de maior estabilidade no bem e o empenho para vivenciar um estilo de vida mais perfeito e puro. Tudo isso sustentado pelo sólido exercício da mortificação. Outra vantagem deriva da própria experiência da tentação. É a ciência da discrição. A alma adquire-a durante a tentação mesma, tomando consciência das próprias forças, sendo capaz de determinar o grau de virtude que possui, usando-o como termo de comparação. "Quem não tem experiên-cia pouco sabe" (Eclo, 34,10). Há, ainda, uma terceira vantagem proveniente da tentação: a plenitude de consolações que Deus acrescenta à vitória da alma fiel, além do bom exemplo oferecido aos outros. Deus sabe muito bem como recompensar o esforço despendido para vencer a tentação, concedendo, sobretudo, o dom especial da humildade e do fervor espiritual. 71 - Preparar-se para a Tentação Quem na vida procura sinceramente a Deus deve saber que sua conduta é uma contínua provocação à malícia do Leviatã (Jó 3,8). De fato, os que com o pecado se sujeitaram à vontade do Maligno são por ele dominados, pois este orgulhoso tirano subjuga seus corações com poder total e consciente segurança. Quando, porém, um espírito dedica-se à busca de Deus, abandona o torpor da sua negligência e, lembrado da primitiva liberdade, rebela-se contra a escravidão do inimigo, este se sente desprezado. Não consegue tolerar que seu escravo se volte contra ele. Por isso, irrita-se e prepara-se para a luta, criando tentações de toda espécie contra o rebelde. Procura, com todas as armas e ataques, penetrar no coração que há tempos julgava ser o proprietário. Assim, o Leviatã, que parecia estar dormindo, repousando tranqüilo no coração do pecador, é despertado. É provocado para o combate ao ver minado seu direito à perversa dominação. "Meu filho , se te apresentas para servir ao Senhor, prepara tua alma para a provação" (Eclo 2,1). Quem se entrega a Deus deve estar preparado para sofrer duros golpes na luta contra aquele a quem, antes, servia tranqüilamente como escravo. 72 - Sugestões Práticas "Foge dos pecados como de uma cobra" (Eclo 21,2). Se tivesses tido coragem de resistir, a esta altura as tentações não existiriam. Elas voltam quando cedemos pela primeira vez, pois Deus quer nos oferecer ocasião de colher o fruto que não colhemos antes. É preciso, pois, estar sempre preparado para tentações mais fortes, quer para reparar os defeitos que nos venceram, quer para chegar aonde Deus nos convida. Quem não segue as inspirações que Deus sugere para evitar algum perigo merece cair nele. Grandes tentações são meios eficazes para uma santidade mais perfeita, se houver coragem e fortaleza para enfrentá-las. É possível que existam certas tentações, passíveis de serem afastadas através da dissimulação, fingindo consentimento. Por exemplo, se uma pessoa boa e fervorosa está sendo tentada a deixar seu Instituto religioso para entrar em outro mais austero, dê-se a ela licença para isso. A CONVERSÃO 73 - A Volta do Filho Pródigo Imaginemos o filho pródigo aos pés de um carvalho enquanto vigia uma vara de porcos. Ele contempla pensativo, aborrecido, esfarrapado e sujo, meditando na possibilidade de voltar. É aí que decide retornar à casa paterna, movido, sobretudo, pelo sentimento de sua atual e mísera condição. Compara o passado com o presente. Rico, que era, tornara-se miserável. Para chegar a tal pobreza, ou melhor, à miséria, foram necessários poucos meses. Está chafurdado no abismo do mal. Sente-se impulsionado a voltar, movido pelo remorso e pelo arrependimento das falhas cometidas. Em seu coração, busca a lembrança da bondade paterna e a compara com a indignidade de sua conduta. Antes de se pôr a caminho, ele medita e planeja melhor modo para o reencontro. Propõe-se, então, a apresentar-se perante o pai, fazendo a confissão sincera de suas culpas, sem justificativas - "vou voltar para meu pai e dizer-lhe: pai, pequei contra Deus e contra ti" (Lc 15,18). O desprezo que mostra por si mesmo leva-o a humilhar-se: "já não mereço ser chamado teu filho" (Lc 15,19). Promete, daquele momento em diante, vida austera e penitente: "trata-me como a um dos teus empregados" (Lc 19). Que mudança num jovem antes indócil, presunçoso e mergulhado em prazeres! O arrependimento transforma a alma penitente. É o que a contrição deve fazer em mim também. Eu tenho que me levantar e voltar, não a meu superior ou a meu juiz, mas a meu Pai. Seu eu perdi o título de filho, ele não perdeu o de Pai. Encontrá-lo-ei cheio de bondade e ternura por mim. Estou certo de que ele mesmo virá a meu encontro para facilitar a minha volta, conceder-me-á prontamente o perdão dos pecados e sustentar-me-á depois, constantemente, no caminho da perfeição. Muitos, depois de ter vivido como eu no pecado e na tibieza, tornaram-se santos e modelos de perfeição. Finalmente, confio que ele derramará sobre mim incontáveis graças, mesmo sem as pedir, e saberá recompensar-me, premiando-me pela vitória conquistada. 74 - A Ressurreição da Alma Se o pecado é a morte da alma, a penitência é sua ressurreição. Ela, de fato, reconcilia nossa vida com Deus e, assim, restitui-nos a verdadeira vida. O que pode haver de mais preciosa e estimável do que a vida reconstituída - participação na própria vida de Deus - pela penitência? A sentença de morte eterna, que antes fulminara o pecador, transforma-se, agora, em direito à vida eterna. Sim, a vida eterna é o fruto saborosíssimo da conversão. O próprio Deus o assegura: "não tenho prazer na morte do ímpio, mas antes que ele mude de conduta e viva" (Ez 33,11). A penitência torna o homem, "na esperança, herdeiro da vida eterna" (Tt 3,7). De escravo do pecado torna-o filho de Deus. Torna-o filho porque o faz justo, e, de inimigo de Deus, o reconduz à sua amizade, por intermédio de sua graça. Tal quadro está apresentado muito bem na parábola do filho pródigo. Quando o pecador, depois de seus inúmeros desatinos, volta arrependido aos pés de Deus e diz "Pai, pequei contra Deus e contra ti" (Lc 15,21), Deus o acolhe como o pai amoroso da parábola. Beija-o com o ósculo da paz. Manda que lhe seja restituída imediatamente a veste nupcial do amor e da graça. Recoloca em sua mão o anel, que é penhor da fé e a marca indelével do Espírito Santo. Prepara, depois, um banquete celestial e substancioso: o corpo e o sangue de Cristo, seu Filho e nosso Salvador, com o qual o nutre, fortalece e recria. Muitas vezes a penitência frutifica de tal modo que a pessoa, ressuscitando do pecado, recebe graça maior do que a anterior. Por isso está escrito que "onde se multiplicou o pecado, a graça transbordou" (Rm 5,20). Aliás, pode-se até dizer que, pela penitência, o pecador acaba recebendo de Deus maior número de graças do que o justo, conforme diz o Evangelho: "assim, os últimos serão os primeiros" (Mt 20,16). 75 - Arrependimento e Confiança Leio no Evangelho que um leproso pede "Senhor, se queres, tens o poder de purificar-me" (Mt 8,2) e, tocado pelo Cristo, é curado imediatamente. Leio também que um centurião se aproxima de Jesus e diz: "Senhor, o meu criado está de cama, lá em casa paralisado e sofrendo demais... Dize uma só palavra e o meu criado ficará curado" (Mt 8,6-8) e, conforme sua fé, naquele mesmo instante, o servo sarou. Esses dois milagres fazem-me refletir que não existe doença que, mediante o recurso da graça do Salvador, não possa ser pronta e prodigiosamente curada, por mais grave e aparentemente insanável que seja. Se não se consegue tirar de nós a lepra do vício e se nosso coração não sabe levantar-se do leito dos prazeres mundanos em que jaz, talvez, há muitos anos, a causa esteja em nós mesmos, na nossa fraqueza, no nosso comodismo e na nossa falta de confiança. Como é deplorável ver que tantos cristãos, mesmo estando cientes de sua triste condição, não sabem decidir-se a abandoná-la de vez. Eu gostaria de tentar incutir nestes ânimos abatidos - apesar de ser um tanto quanto difícil - a confiança e a fé. Por que retardar o abandono dos próprios pecados, por que não subir mais alto de onde se caiu, para conseguir ser perfeito cristão e, até mesmo, santo? Nada é impossível ou difícil para Deus. Se o demônio pôde induzir à queda no pecado, não poderá Deus ressuscitar e reparar essa desgraça? Pensemos bem e não desconfiemos de Deus. Erramos mais desconfiando de Deus do que cometendo pecados. Quem caiu em culpas gravíssimas e as multiplicou sem medidas, mas não chegou a ponto de negar a misericórdia e o poder de Deus, não tem motivo para desespero. Pelo contrário, sabe que pode manter os olhos confiantes na bondade do Senhor até que Ele se mova de compaixão. 76 - Crer no Perdão de Deus Os artifícios do Maligno têm como finalidade tirar-nos a confiança, porque ela pode nos salvar: "é na esperança que já fomos salvos" (Rm 8,24). Alguém pode admitir que Deu perdoe, levantando, porém, a questão: será Ele sempre justo e está disposto a voltar para nós seu olhar compassivo e benevolente após tantas culpas, com as quais provocamos sua ira? Entendo e respondo: quem deseja medir a ira de Deus com o metro incorrerá em erro seriamente perigoso para si e injurioso para Ele. Se a ira divina fosse uma paixão igual à que domina as pessoas, haveria motivo suficiente para temer a impossibilidade de se apagar o enorme incêndio de ira que provoca nossos pecados. No entanto, como em Deus não há sombra de paixão e, mesmo nos punindo, não o faz com ira, tendo sempre um olhar amoroso para conosco, podemos, em qualquer circunstância, criar coragem e confiar no valor da penitência. Acreditemos, sempre, que Deus nos ama, mesmo quando se mostra irado. Se nos ameaça, porque nos afastamos dele, significa, então, que, com muito mais razão, nos quer atrair para si. É preciso ter um conceito mais claro de Deus, considerando que não poupou, por nosso amor, nem mesmo seu Filho unigênito, mas o entregou aos mais cruéis sofrimentos e à morte ignominiosa para nos redimir. Se por trinta e três anos o Verbo feito homem correu atrás dos pecadores que fugiam dele, se ele continua, ainda hoje, a enviar mensageiros, advertindo, exortando e oferecendo sua misericórdia, como poderá rejeitar-me? Não, não é possível! Deus jamais rejeita a penitência sincera, mesmo que a pessoa tenha ido a fundo em todos os males. Pelo contrário, acolhe-a, abraça-a, ajuda-a a levantar-se e a recuperar sua primitiva dignidade. 77 - Conversão e Paz de Coração "Pois agora, então, voltai para mim de todo o coração e eu estou devolvendo os anos de colheita comidos pelo gafanhoto, o grilo, o saltão e o louva-deus" (Jl 2,12-25), quando as paixões dominavam em vós. Que consolação para um pecador arrependido perceber que está tão enriquecido, depois de tantas faltas! Que alegria sentir que está circundado de tanta glória após tanta ignomínia! Como deve receber com alegria a saúde espiritual depois da triste experiência doentia do pecado! Como é diferente a vida, depois das dificuldades, angustias e da agonia da morte, sem remorsos, tristezas ou medo! Paz eterna no coração, serenidade imperturbável de ânimo, tranqüilidade inefável no espírito, estes são os frutos da penitência, consoladores para a alma e vividos com agradável experiência! Convertamos, pois, imediata e sinceramente, nosso coração a Deus. Ao rever nossos erros e nossas falhas, experimentemos o mais profundo desprazer, a mais desagradável abominação e a aversão mais repugnante. Assumamos resolutamente e com desejo de continuidade a reviravolta de nossa vida e a mudança de nossas atitudes. Com alegre esperança, com a grande confiança em obter o perdão, confessemos ao sacerdote todas as culpas cometidas, dispostos a dar a devida satisfação a Deus e aos homens. Assim lavada e purificada a alma no sangue do Cordeiro imaculado, Cristo Jesus, que veio tirar os pecados do mundo (Jo 1,29), seremos dignos de sair ao seu encontro e de ser admitidos por Ele à feliz posse de todos os dons que traz consigo e de sua própria herança: "essa vai andar comigo, vestida de branco, pois é digna" (Ap 3,4). 78 - A Conversão É Menos Difícil do que Parece Se São Paulo considerava leve qualquer tribulação sofrida por ele, em comparação com o imenso penhor de glória a que aspirava (2Cor 4,17), não será muito mais simples dominar nossas paixões? Não somos cercados por perigos, morte cotidiana, açoites, cárceres, dissabores que ele teve de enfrentar. Temos, somente, que nos livrar da escravidão do pecado e voltar à vida da graça. Por que desanimar e nos deixar dominar pela desconfiança? Os negociantes, que procuram além-oceano suas riquezas, sofrem, muitas vezes, naufrágios e, contudo, recomeçam com coragem, do princípio, prosseguindo em suas viagens incertas e perigosas. Nós, que temos garantia de feliz êxito, por que não recomeçarmos a viagem interrompida? Permaneceremos de braços cruzados, refletindo sobre nossas perdas sem repará-las com solicitude? Muitos santos também pecaram, e até gravemente: Davi, São Pedro e outros. Entretanto, por causa disso, ficaram abatidos e sentiram-se fracassados? Pelo contrário, levantaram-se com maior ardor e tornaram-se mais santos do que antes. Se nas doenças corporais não se deve perder a esperança, por que perdê-la em enfermidades da alma, que não são absolutamente irremediáveis como as do corpo comumente são? Se fosse verdade que quem peca gravemente não pode recuperar-se jamais, eu deveria acreditar que pouquíssimos entrariam no Paraíso. Todavia, acontece o contrário. Os santos mais ilustres foram os que antes caíram em pecado, como São Pedro, Madalena e São Paulo. O ardor que antes eles tinham usado para fazer o mal foi empregado, posteriormente, para praticar o bem. É por isso que o Maligno articula tantas tramas para impedir nossa conversão. Ele sabe muito bem que quem começa a caminhada rumo à santidade, a partir da conversão, não pára quando se dispõe a servir Cristo com todo fervor. E, cientes da dívida que têm, chegam a sobrepujar os justos que viveram inocentemente: "muitos que são os últimos, serão primeiros" (Mt 19,30). 79 - Deus Sustenta os Primeiros Passos da Conversão Deus manifesta, em sumo grau, sua benignidade logo que uma pessoa dá os primeiros passos, ainda que incertos e imperfeitos, no caminho da conversão. Não a rejeita, mas a recompensa com inúmeras retribuições. Assim Ele fala ao seu povo pelos lábios de Isaías: (Is 57,17-18) fiquei indignado com a covardia de sua cobiça, e eu o feri escondendome indignado. E ele, rebelde, continuava pelo caminho que queria. Estou vendo o caminho por onde vai. Vou curá-lo, reanimá-lo, deixálo totalmente restabelecido, a ele e aos seus que estão sofrendo. O rei Acab chegara ao máximo da impiedade. O sangue do inocente Nabot, traído enquanto se preparava para tomar posse da sua vinha, ainda escorria quente pelo chão. Deus sumamente indignado mandou seu profeta ao encontro do pérfido rei. "Isto lhe dirás: ´Assim fala o Senhor: Tu mataste e ainda por cima roubas!´ E acrescentarás: ´Assim diz o Senhor: No mesmo lugar em que os cães lamberam o sangue de Nabot, lamberão também o teu... Farei cair sobre ti a desgraça: varrerei a tua descendência. Eliminarei da casa de Acab todo o macho de qualquer categoria... porque provocaste a minha ira´ (1Rs 21,19, seguintes). não houve ninguém que se vendesse como Acab para fazer o mal aos olhos do Senhor. Portou-se de modo abominável (1Rs 21,25, seguintes). Este ímpio, ao ouvir as ameaças do profeta, ficou tomado de terror, deu alguns sinais de arrependimento e humilhação: "quando Acab ouviu estas palavras, rasgou as roupas, pôs um cilício sobre a pele e jejuou" (Rs 21,27). Deus, diante disso, não conseguiu reter o ímpeto de seu coração. Chamou imediatamente o profeta e disse-lhe afetuosa e compassivamente: "viste como Acab humilhou-se diante de mim? Já que ele assim procedeu, não o castigarei durante a sua vida" (1Rs 21,29). Ó piedosas entranhas de misericórdia! 80 - Não Adiar o Propósito da Conversão Adiar continuamente decisões, dar tempo ao tempo, é sempre algo muito perigoso, em qualquer circunstância. Portanto, torna-se mais perigoso ainda quando se trata da conversão do pecado a Cristo. Não digas ´pequei, e que de mal me aconteceu?´, pois o Altíssimo é um retribuidor paciente. Não percas o temor por causa do perdão, acrescentando pecado a pecado... Não demores em voltar para o Senhor e não adies de um dia para outro, pois sua ira vem de repente e, no dia da vingança, serás arrebatado (Eclo 5,4, seguintes). Aí está porque é perigoso adiar a conversão. Por isso, a Santa Escritura nos impele à conversão sem perda de tempo. Uma verdade bem acatada basta para salvar uma alma. Acrescenta, ainda, São Paulo: Ou será que desprezas as riquezas de sua bondade, de sua tolerância, de sua paciência, não entendendo que a bondade de Deus te convida à conversão? Por causa de teu endurecimento e de teu coração impenitente, estás acumulando ira para ti mesmo, no dia da ira, quando se revelará o justo juízo de Deus, que retribuirá a cada um segundo as suas obras... Tribulação e angústia para todo aquele que faz o mal, primeiro para o judeu, mas também para o grego, - pois Deus não faz acepção de pessoas (Rm 2,4, seguintes). A PENITÊNCIA SACRAMENTAL 81 - A Confissão, Dom Divino Deus, desejoso de perdoar nossos pecados e restituir-nos sua graça, chama-nos e convida-nos ao sacramento da reconciliação. Entretanto, pode acontecer, às vezes, que a simples idéia de ter que se aproximar da confissão desperte em nosso coração um certo sentimento de medo e temor. O próprio demônio aumenta e exagera essas falsas apreensões. Ele, que antes havia eliminado todo pudor para nos induzir mais facilmente ao pecado, redobra, então, o sentimento de confusão e de vergonha para nos impedir a confissão de nossas culpas. Ora, Deus nos garante que, quando decidimos colocar nossas culpas aos pés de um ministro, com sinceridade e verdadeiro arrependimento, afastará de nós toda confusão, transformando-a em verdadeira glória. De fato, não se pode negar, a não ser que renegássemos a fé, que, por intermédio da reconciliação, Deus perdoa inteiramente a mancha de culpa. E cancela totalmente a vergonha, por mais grave que seja, fazendo reflorir na alma a vida espiritual que havia sido congelada pelo pecado. Na confissão, novamente a alma é lavada, purificada e adornada com um raio de puríssima luz, que o Verbo de Deus nela infunde. Ele reveste-a com o traje precioso da graça. Coloca-lhe sobre a cabeça uma coroa esplêndida cravejada de todas as virtudes e, no dedo, o anel de ouro da caridade. Desse modo, a alma recupera dons preciosos e ricos tesouros de merecimento existentes antes do pecado. Aliás, pode acontecer que, ressurgindo renovada, adquira um grau ainda maior de graça do que tinha, antes de cair no pecado. Por que temer ou sofrer confusão e vergonha, se nos esperam honras verdadeiras e um triunfo inigualável? 82 - Arrependimento e Propósito Sabemos que o demônio e o pecado estão sempre nos atacando com mil subterfúgios, ameaçando-nos e nos tentando por todos os lados. Querem nos dar a impressão de que é impossível fugir de suas garras, quebrar as correntes dos maus e fortes hábitos, superar dificuldades intransponíveis para, então, viver na graça de Deus. Sabemos muito bem, porém, que o Senhor mesmo, por meio do sacramento da reconciliação, vem nos libertar das mãos de nossos inimigos, combate por nós contra eles e é o fiador responsável de nossa glória e liberdade recuperada. De nós exige apenas o `quero', assumido com todo o ardor do coração, para, de imediato, ficarmos livres da culpa, graças à onipotência divina. Cabem-nos resolução, determinação e propósito, pois Jesus Cristo já ressuscitou triunfante, vencendo com sua morte o pecado e o demônio. Aumentemos ainda mais a glória de seu triunfo, fazendo que Ele vença o pecado e o demônio, também em cada um de nós. Digamos em nosso coração: Maldito pecado, eu te detesto! Maldito demônio, eu te renuncio! Malditas cadeias, odiosas correntes, quero vos romper para sempre. E a vós, meu Jesus, meu Deus, eu me submeto, me entrego e em vós me abandono. 83 - O Fruto Suavíssimo da Penitência A reconciliação com Deus abre-nos o tesouro dos maiores e mais desejáveis bens. Compreende, antes de tudo, a remissão de todos os pecados. Não existe delito, por enorme que seja, quanto à malícia e ao número que a penitência não deixe de apagar, não uma só vez, mas sempre e infinitas vezes. Deus mesmo nos garante: se o ímpio se arrepender de todos os pecados cometidos, guardar todas as minhas leis e fizer o que é direito e justo, viverá com certeza e não morrerá. Nenhum dos crimes cometidos será lembrado contra ele. Viverá por causa da justiça que praticou (Ez 18,21-22). Essas são promessas infalíveis do Senhor pela boca do profeta Ezequiel. E, pela boca de Miquéias, Deus confirma aplacar-se ainda mais, em vista de nossa penitência, a tal ponto que promete calcar sob os pés todas as nossas iniqüidades e arremessar todos os nossos pecados ao fundo do mar, para serem sepultados com esquecimento eterno (Mq 7,18-19). Depois disso, continuaremos duvidando ainda das promessas divinas? Impossível, pois a Verdade não pode enganar-se a si mesma. É o que afirma São João: "se reconhecemos os nossos pecados, então Deus mostra-se fiel e justo, para nos perdoar os pecados e nos purificar de toda injustiça" (1Jo 1,9). São frutos da penitência: o perdão instantâneo de todas as culpas, quantas possam ter sido cometidas em muitos anos de vida irregular; a graça do perdão total, mesmo que alguém tivesse abusado muitas vezes da divina misericórdia; a purificação completa da alma, de tal modo que não apareça sombra de mancha alguma, nem mesmo da mais recôndita e escondida. Isso não é algo realmente admirável? Não deve ser para todos nós algo sumamente estimável e desejável? 84 - O Confessor e o Penitente O sacerdote, que se assenta no tribunal da penitência, representa a pessoa do próprio Cristo e o substitui. Jamais o ministro de Cristo poderá deixar de tratar, com espírito de doçura e mansidão, os penitentes que dele se aproximam. O próprio Cristo não rejeitou pecador algum que a Ele recorreu, demonstrando verdadeiros sinais de arrependimento. Recebe sempre com muita afabilidade os publicanos. Acolhe amorosamente as lágrimas das pobres madalenas. Despediu, absolvidas, as adúlteras já condenadas à morte. Prometeu levar consigo ao paraíso um ladrão que a Ele recorreu pouco depois de havê-lo insultado. Acaso poderá o sacerdote mostrar repugnância por alguém que se apresente ferido, com inúmeras chagas, sobre as quais o Médico Divino sempre se dignou derramar, como bálsamo celeste, seu preciosíssimo Sangue, com suavidade e eficácia? O confessor é homem como todos os demais, sujeito aos mesmos perigos do pecado, sujeito a fraquezas, capaz de se compadecer diante da experiência das quedas pessoais e alheias, obrigado, também ele, a apresentar-se ao sacramento da penitência para purificar-se dos próprios pecados. Conhece a fundo a fragilidade humana. Sabe que as pessoas mais espiritualizadas e santas estão sujeitas a pecar até gravemente. Encontra-se, pois, em situação de entender bem o gesto de humildade que transforma o pecador em justo a partir do instante em que reconhece seu pecado, conforme a sábia expressão de Santo Ambrósio: "já que somos todos pecadores, é muito mais digno de louvor quem se mostra humilde, e é muito mais justo aquele que se reconhece indigno". Por isso, é evidente que o confessor tenha muito mais motivos para se consolar, vendo a eficácia da graça, quanto mais graves são as culpas confessadas e quanto maiores as dificuldades a serem superadas. Além disso, tem sólida convicção de que o penitente pertence ao número dos eleitos que São João contempla vestidos de branco diante do trono de Deus, porque "lavaram e alvejaram as suas vestes no sangue do Cordeiro" (Ap 7,14). 85 - Nenhuma Angústia ao se Confessar Depois que o Senhor lava a alma dos pecados, quer tirar também os defeitos, as imperfeições e, por fim, as inclinações naturais desordenadas. Contudo, isso não deve provocar angústia alguma a quem deseja aproximar-se da confissão. Quando se tratar de defeitos e negligências, mesmo que seja sempre útil e aconselhável confessá-los, não é necessário fazê-lo, conforme a doutrina do Concílio de Trento. Aliás, a própria comunhão os perdoa, conforme ensina a Igreja. Além disso, qualquer ato de caridade sincera é suficiente para laválos, porque, sendo eles somente o efeito de uma diminuição da caridade, qualquer ação boa os apaga completamente. Amemos, portanto, o Senhor com todo o entendimento, com toda a alma, com todo o coração e com todas as forças, conforme o primeiro mandamento do Evangelho. Assim, o Senhor não terá nada contra nós, nem nós contra Ele. O sarmento não fica destacado da videira. O agricultor deve podá-lo, por estar na videira dando frutos, a fim de que produza ainda mais (Jo 15,2). Quando Pedro ouviu a repreensão "homem de pouca fé, por que duvidaste?" (Mt 14,31), não se sentiu distante, nem na iminência de ser afastado, mas próximo dele e pronto para aproximar-se ainda mais, atraído por sua especial amizade. Estava, naquele momento, ansioso como a esposa dos Cânticos: "leva-me atrás de ti" (Ct 1,4). 86 - Padre Gaspar como Confessor O bem que Padre Gaspar realizou através do ministério da Confissão foi excepcionalmente enorme. Na orientação das almas tinha particular habilidade e o acompanhamento do Senhor, unido a grande prudência. Não havia pessoa que, por mais enleada por paixões e vícios, não encontrasse, ao recorrer à caridade de Padre Gaspar, o piedoso samaritano com o óleo da bondade e da prudência, cicatrizando feridas profundas. Inúmeros párocos e sacerdotes julgavam a melhor solução, para certos casos particularmente difíceis e intrincados, enviar seus penitentes a Padre Gaspar. No confessionário, Padre Gaspar manifestava admirável doçura e delicadeza para atender. Além disso, sabia apresentar reflexões oportunas, conselhos e soluções, de acordo com as condições das pessoas. Orientava sacerdotes, pessoas de origem nobre ou humilde, gente do povo. Sabia sempre dizer o que convinha melhor a cada um. Particularmente notáveis eram nele a reverência e o respeito para com os Padres. Uma vez, não podendo ir pessoalmente confessar um sacerdote, por estar imobilizado na cama, mandou um jovem confrade, recomendando-lhe: "Vá tu, então, mas lembre-se de tratálo com todo respeito, humildade e reverência". Padre Gaspar teve a consolação de poder ver, por seu intermédio e por ação de seus companheiros, inúmeras almas conquistadas para Deus, reconduzidas ao bom caminho, e muitas endereçadas para a perfeição. NA ESCOLA DE CRISTO CRUCIFICADO 87 - Dispor-se a Sofrer com Cristo para Reinar com Ele Muitas vezes e em diversas ocasiões, Cristo quis revelar a seus Apóstolos os sofrimentos de sua paixão e morte. A primeira, quando Pedro fez sua esplêndida profissão de fé, confessando quem Ele era: "tu és o Messias, o Cristo, o Filho do Deus vivo" (Mt 16,16). A segunda, depois de haver curado o epilético endemoniado, porque "todos ficaram maravilhados com o poder de Deus" (Lc 9,43). A terceira, quando, caminhando a sós com os Apóstolos, disse-lhes: "eis que estamos subindo para Jerusalém, e o Filho do Homem será entregue aos sumos sacerdotes e aos escribas. Eles o condenarão à morte... Mas no terceiro dia, ressuscitará" (Mt 20,17-19). Com isso, o Senhor quis preparar seus discípulos para enfrentarem, com coragem e constância, seus próprios sofrimentos. É significativo o fato de que Ele lhes revelou a paixão próxima no momento em que mais se viu elogiado e exaltado pela confissão de Pedro ou pela grandeza de seus milagres. Preparava, assim, os Apóstolos, em dias de glória e alegria, para o que depois viria acontecer em dias de dor. Queria dizerlhes: "já que me quisestes seguir, preparai-vos também para sofrer comigo, a fim de não fracassar na fé e no amor". Jesus, Mestre afável, para onde ireis subir também quero subir. Padecer convosco é o mesmo que subir e caminhar, jamais descer. Além disso, se eu estiver em vossa companhia, nada tenho a temer, porque terei sempre vosso auxílio junto de mim. Convosco quero sofrer durante esta Jerusalém terrestre, para reinar convosco na Jerusalém celeste. 88 - A Mais Pérfida Traição Não é coisa nova no mundo que um inocente, um homem de virtude, um benfeitor, seja traído por um amigo, especialmente o que mais recebeu benefícios. Todavia, assim como não se pode encontrar pessoa mais inocente e bondosa do que Jesus, também não houve alguém mais beneficiado e mais íntimo dele do que o traidor Judas. Por isso é que se diz que não houve antes, nem haverá depois, uma traição mais perversa do que essa. Que enorme ferimento deve ter sido este para o coração de Jesus. "Estou numa tristeza mortal" (Mt 26,38). "Se fosse um inimigo que me insultasse, eu agüentaria" (Sl 55,13). Porém, de uma pessoa que me é tão querida, ao qual sei ter feito tanto bem, isso me transpassa o coração. Desse modo, Jesus, sem dúvida, o ser humano mais forte e invencível, por livre escolha, sujeita-se como homem a carregar o peso dos sofrimentos que também nós provamos, para remir nossos pecados. Por ser o conhecimento de sua mente muito mais profundo, a sensibilidade do seu coração muito mais refinada, seus sofrimentos tornam-se muito mais dolorosos. A fortíssima resistência que Ele opõe aos ímpetos da dor, que o aflige, tira-lhe das veias sangue com tal força que o faz suar em grande quantidade. Sinal inaudito de uma dor diferente, dor imensa. "Amigo, para que viestes?" (Mt 26,50). Judas se aproxima com ar de amigo e estende a mão em direção a Jesus para abraçá-lo. Que fará agora o coração de Jesus? Que momento excepcional para o acolher afável e serenamente, garantindo-lhe o perdão! Na verdade, não o rejeita e deixa-se beijar, acrescentando: "Judas, com um beijo tu entregas o Filho do Homem?" (Lc 22,48). Procuremos compreender a enorme perversidade da traição. Judas havia combinado com os soldados exatamente este modo para prender Jesus. Ao sinal combinado, eles se atiraram sobre Jesus, amarraram-no e levaram-no embora. Após tantos sinais de amor, é traído perfidamente por um discípulo favorecido, familiar, privilegiado! Traído por seus mais cruéis inimigos por uma quantia tão insignificante de trinta moedas! Jesus entrevê, então, que será traído também por muitos cristãos e sacerdotes por Ele imensamente agraciados! Que dor e angústia para aquele coração! 89 - A Sentença Mais Injusta Não é fácil imaginar Jesus inocente, sozinho, abandonado até mesmo pelos discípulos, diante dos juízes, seus inimigos, sem experimentar profunda comoção. Estão à procura de testemunhas contra Jesus para que possam ser subornadas com dinheiro e para que deponham falsamente. Interrogam Jesus e, ao mesmo tempo, negam-lhe o direito de falar. Se ele cala, consideram o silêncio como uma declaração de culpa. Se ele fala, fecham-lhe a boca com uma bofetada. É um tribunal onde a justiça se apresenta às avessas, onde dominam somente ira, furor e desordem. Sigamos agora Jesus diante do tribunal do governador romano, presumivelmente imparcial e racional. Pilatos, ao interrogar Jesus por causa das acusações, e percebendo sua inocência, conclui que os judeus querem levá-lo à morte somente por inveja. Então, sai fora do tribunal e declara que não encontra em Jesus culpa alguma. Além disso, Herodes, ao qual, nesse meio-tempo, o havia enviado, também o tinha proclamado inocente. Por isso, determina que, após a punição com chicotadas, o colocasse em liberdade. Como assim? Cristo é declarado inocente e tem que ser chicoteado para ser libertado? Por incrível que pareça, Pilatos fez exatamente isso. Não só lhe nega justiça, apesar de inocente, condenando-o, torna-se execrável quando lhe nega a justiça devida a um réu, pelo modo como lhe dá a punição. Naquele tempo os juízes estabeleciam os detalhes da flagelação. Para Jesus, não. É simplesmente deixado ao bel-prazer dos carrascos. É-nos muito chocante ter que relatar o atroz castigo a que foi submetido o inocente Jesus. Os soldados, colocando em sua cabeça uma coroa de espinhos, escarnecem-no com irônicas adorações como a um rei burlesco. Não se sabe dizer se é maior a dor ou a ignomínia. Sabe-se que muitos inocentes foram condenados. Porém, quando e onde houve um juiz que antes afirmara não existir no réu causa de morte, e, depois, condena-o à morte? Ao rezar a Via Sacra, diante da primeira estação, ouvi Jesus dizer: se eu, inocente, deixo-me condenar, por que tu, réu de culpas mil, desejas, com tantos argumentos, passar por justo em tudo diante dos homens? 90 - O Suplício Mais Atroz O suplício de Jesus excede e sobrepuja a todos os sofrimentos. Não só nas mãos e nos pés, mas em todas as partes do corpo, dilaceradas, ele sofre, simultaneamente, dores agudíssimas. Esse dilúvio de dores, que brota e provém de todo o corpo e da alma, faz naufragar seu coração. Tais sofrimentos sobrepujam qualquer tipo de experiência e avaliação humanas, porque os sentidos de Jesus são os mais perfeitos e sensíveis. Seu corpo, formado pelo Espírito Santo no seio da Virgem, era o mais delicado e aprimorado. A alma, pela excelência do espírito e imensa brandura de coração, era capaz de receber com total intensidade qualquer tipo de tristeza. Porém, a força do amor - é uma pergunta que brota espontaneamente - não diminui as dores de Jesus ou, pelo menos, suas tristezas interiores? Um amor tão intenso que o faz exclamar: "tenho sede!" (Jo 19,28); sede de salvação em relação a todas as pessoas, sede de sofrer justamente por sua salvação? Não, não! Pelo contrário, fazem aumentar suas dores. Se, de fato, ele as assumiu voluntariamente para nos libertar do pecado, as assumiu de maneira tal que fossem proporcionais à grandeza da satisfação que, por nossos pecados, ele aceitava oferecer. Foi por isso que derramou todo o seu sangue como se estivesse sob a ação de uma prensa. Este é, certamente, o suplício mais atroz. Ó vós todos que passais pelo caminho marcado por minhas manchas de sangue - parece ser o convite de Jesus - fixai em mim o olhar de vossa contemplação e vede se há dor igual à minha (Lm 1,12). 91 - Os Sofrimentos Morais de Cristo Enquanto Jesus sofre terrivelmente, os carrascos lhe preparam um tormento especial. Este eu considero o tormento dos tormentos. Diante de seus olhos insultam sua desgraça, escarnecem de seus gemidos e ridicularizam sua dor. Chegam, desse modo, a ferir as profundezas de seu espírito. Que ferida cruelmente dolorosa para um coração que ama sentir que não somente se busca sua morte! Sentir, nos últimos momentos da existência, insultos por parte daqueles a quem Ele, com sua morte, proporcionará a salvação! Que chaga profunda se abre naquele coração ferido pelos pecados de todos os seres humanos! Um coração que, com profunda contrição, aceitou para si os pecados dos outros como se fossem seus! Até mesmo os ladrões que estão crucificados ao seu lado o insultam. E Jesus? Assim que um deles se retrata e reconhece o erro cometido, Jesus está pronto para lhe dizer: "em verdade te digo: hoje estarás comigo no paraíso" (Lc 23,43). Até isso agrava suas dores. O ladrão se salva, mas meu povo, minha nação escolhida e meu querido discípulo Judas se condenam! Qual a utilidade de tanto sangue que estou derramando? Para muitos esse sangue servirá de julgamento e esta cruz será de escândalo! Assim pensando, suspira em direção ao céu. Depois inclina aflito o olhar. Ah! Vê sua mãe. Com aquele olhar as águas sangrentas da compaixão amorosa, que haviam inundado o coração da Mãe, como um mar cheio de amargura, voltam-se com jorro impetuoso em direção ao Filho, que está desfigurado pelo sofrimento. Transbordam. Chora Maria e, com ela, chora também João. "Mulher - eis o teu filho" (Jo 19,26). Voltando-se ao discípulo, acrescenta: "Eis a tua mãe" (Jo 19,27). 92 - Contemplação da Paixão Na oração, comece por Cristo e Sua Paixão e, depois, se Deus se dignar atraí-lo, deixe o espírito livre. Um, dentre outros frutos, e são muitos, que deves colher da meditação da Paixão, seja este: não basta apenas arrepender-te dos pecados passados; procure também te preocupar com a presença de paixões desordenadas presentes em ti, as quais muito contribuíram para crucificar o Senhor. Outro fruto é: peça perdão pelas culpas cometidas e a graça de contínua aversão por ti mesmo, a fim de nunca mais o ofender. Peça que ele te conceda amá-lo como merece e servi-lo, no futuro, da melhor maneira possível, em vista de tantos sofrimentos padecidos em teu favor. O terceiro fruto é, com bastante empenho, procurar extirpar toda e qualquer inclinação desordenada, por menor que seja. O quarto é que te empenhe, com todas as forças, para imitar as virtudes do Salvador, que sofreu não só para nos resgatar, cancelando nossas iniqüidades, mas também para nos dar exemplo e nos estimular a seguir suas pegadas. O que devemos fazer por Aquele que tanto padeceu por nossa causa, "que nos amou e se entregou por nós"? (Gl 2,20). 93 - Sempre com Cristo Crucificado É digno da máxima atenção o que aconteceu a Pedro, depois que o Senhor fez o primeiro anúncio de sua Paixão. O generoso apóstolo havia apenas enunciado, à luz de especial iluminação do céu, sua profissão de fé em Cristo, Filho de Deus vivo. Em seguida, manifestou enorme imaturidade, presente em sua natureza humana. Quando Cristo anunciou a proximidade de sua Paixão, Pedro protestou veementemente: "Deus não permita tal coisa, Senhor! Que isso nunca te aconteça!" (Mt 16,22), demonstrando que não havia compreendido absolutamente nada sobre o mistério da Paixão. A resposta de Cristo foi muito contundente: "afasta-te de mim, Satanás! Tu estás sendo para mim uma pedra de tropeço, pois não tens em mente as coisas de Deus, e sim, as dos homens!" (Mt 16,23). É o mesmo que dizer: tu que há pouco me honraste, afirmando que eu sou o Filho do Deus vivo, agora te tornas meu adversário e tentador, opondo-te à minha Paixão e querendo afastar-me dela, contrariando a vontade de meu Pai, que deseja que eu a sofra. Tu estás ainda muito longe da sabedoria celeste, que conhece e aprecia as coisas ordenadas por Deus. Tu te encontras, ao contrário, muito preso à sabedoria humana e terrestre, que julga segundo os critérios dos homens. Siga-me e aprendas a julgar as coisas conforme meus critérios. Diante disso é que se pode avaliar quanta consideração e apreço tinha Cristo por sua Paixão e morte, porque ordenadas pela vontade do Pai em vista da salvação do mundo. E pode-se entrever também como ele deseja que valorizemos bastante os sofrimentos e as humilhações que iremos encontrar na vida de serviço e obediência a Deus. Assim, se alguém nos quiser desviar das cruzes - mesmo sendo nosso bom amigo e talvez até iluminado por Deus em outras áreas, - vamos ter que considerá-lo como tentador e pedra de escândalo. É preciso, então, apreciar e amar muito aquilo que Deus ama e estima, evitar e recusar o que Deus abomina e rejeita. 94 - Tende em Vós os Mesmos Sentimentos de Jesus Cristo Os Evangelistas, referindo-se às profecias da Paixão feitas por Cristo aos Apóstolos, observam que "eles nada compreenderam de tudo isso: o sentido da palavra lhes ficava encoberto e eles não entendiam o que lhes era dito" (Lc 18,34), mas "tinham medo de fazer perguntas sobre o assunto" (Lc 9,45) e "ficaram muito sentidos" (Mt 18,31). De fato, nem todos os que lêem o relato da Paixão ou ouvem falar dela chegam a entendê-la, a aprofundá-la e a formar dela uma justa idéia, assim como não a entendiam, nem a aprofundavam, naquele momento, os Apóstolos, por serem ainda imperfeitos. Ter idéia exata da Paixão, aprofundar seus mistérios, colher frutos e riquezas que ela encerra é dom que Deus, gradativamente, concede a seus eleitos. Os Apóstolos, então, não podiam entender, porque ainda eram imperfeitos. Possuíam uma idéia muito confusa do sofrimento e das humilhações. Tinham muito medo delas. Na verdade apreciavam e amavam demasiadamente as honrarias e o prestígio mundano (Mt 20,20, seguintes). Quando Cristo anunciava-lhes sua Paixão, entristeciam-se muito e desanimavam, porque julgavam coisa indigna, para o Cristo, assumir algo do gênero. Daqui deriva o fato de, também eu, quando medito sobre a Paixão, ficar indiferente e sem sentimento, pois me preparo para meditar este mistério com disposição contrária a ele. Terei de pedir ao Senhor que me conceda o dom de compreender sua Paixão, que me dê o justo conceito que ela encerra, de modo a realizar também em mim o desejo de São Paulo: "haja entre vós o mesmo sentir e pensar que em Jesus Cristo" (Fl 2,5). 95 - O Verdadeiro Sentido de Compaixão Ó Jesus, nosso amor, queremos nos aproximar de teu corpo coberto de sangue para reparar, com o justo obséquio de nossas lágrimas, a injúria cruel que te foi infligida. Estamos vendo teu corpo dilacerado por tantas chagas, que não somente lhe tiraram a beleza, mas até mesmo a aparência humana. Tua cabeça está coberta de muitos espinhos. Tuas mãos e teus pés perfurados, teu lado aberto pela lança. Queremos fixar aí nosso olhar, assim, com a dor que provoca tal visão, saciaremos o desejo ardente de nosso coração, convictos de que não poderemos jamais chorar o quanto mereces. Jesus, essa é a compaixão que desejamos demonstrar por ti. Agora, fala e mostra-nos o que devemos fazer para consolar teu coração aflito. Sabemos bem que nada pode oferecer-te tanto conforto quanto produzir em nós os frutos provenientes da Paixão: destruir o pecado e reavivar em nós o amor por ti. Estamos desejosos de te oferecer um coração livre de qualquer afeto desordenado, afastando completamente de nós o pecado e os defeitos que mais te desagradam. Almejamos ter uma conduta virtuosa de vida, conforme a tua vontade. Não, não queremos que nossa compaixão acabe no pranto. Desejamos nos empenhar em consolar-te com nossas obras. Dá-nos agora, com tua bênção, um sinal de que nossas lágrimas te são agradáveis. De ti esperamos inúmeras graças, bem eficazes, a fim de que, vindo beijar tuas chagas e misturar nossas lágrimas com teu sangue, possamos compreender melhor e colocar em prática, em nossa vida, aquilo que nos pedes para teu consolo. 96 - A Paixão de Cristo no Íntimo do Coração Cristo revelou aos Apóstolos os sofrimentos e a morte que o esperavam, para mostrar como ele tinha sempre presente no coração sua Paixão e continuava a saborear internamente suas amarguras, bebendo sem cessar este cálice tão penoso. Deste modo, quando comia e bebia, pregava e conversava, fazia milagres e realizava prodígios, tinha sempre presente no espírito o pensamento da Paixão. Em sua gloriosa Transfiguração, Ele falava dela com Moisés e Elias, aparentando ser conversa agradável, embora fosse certamente muito dolorosa (Lc 9,30, seguintes). Ele fez tudo isso com a finalidade de mover-me com seu exemplo, a fim de que eu também possa ter sempre presente, no espírito, sua Paixão e procure pensar nela, dela falar de boa vontade e fazer dela o pão que se come com todos os outros alimentos. Meu bom Jesus, como não sentir gosto em poder pensar naquilo que Vós sempre pensastes e em poder falar daquilo que tantas vezes falastes? Meu desejo, ó meu amado Bem, é fazer um ramalhete de flores com vossos sofrimentos. Quero colocá-lo diante dos olhos e no peito, recordando-me sempre dele, movendo-me à compaixão e ao amor por Vós, mais que por mim mesmo (Ct 1,13). Não vou unir num só feixe vossos sofrimentos, mas meditar neles um a um, enquanto caminho por esta vida mortal, consolando-me com seu perfume, até que consiga conquistar a vida eterna..

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